Próximos da conclusão do tempo quaresmal, entramos numa semana plena de movimentos, sensibilidades, emoções e declarações. A dinâmica litúrgica entrelaça dois sentimentos: a alegria ao ver o Senhor entrar em Jerusalém e a piedade ao ver o Senhor morrer por amor. Tudo está em torno das celebrações centrais da vida cristã: Paixão, Morte e Ressurreição de Jesus Cristo.
A Semana é Santa porque é cheia de autenticidade. Maria Madalena declara a sua paixão. Os discípulos sentem tristeza e ficam desorientados. Judas decide pela traição. Jesus se oferta por amor. É nessa semana que todos os que viviam em torno de Jesus revelam suas humanidades.
Segundo os relatos evangélicos, Jesus desconcerta todos quando sobe em direção a Jerusalém. Os mais religiosos, os observantes da religião, os fariseus, os escribas, os sacerdotes, os anciãos e o povo, todos de algum modo foram tocados pela compaixão e pela paixão de Cristo. Ele construiu um movimento ousado de resgate do humano e da integração da vida, por isso foi capaz de questionar os abusadores da religião e os que desprezavam a vida. Vê-se claramente em toda a narração evangélica que, para alguns, a alegria suscitada por Jesus é motivo de fastídio e irritação. A alegria é incômoda, absurda e escandalosa para aqueles que se consideram justos e “fiéis” à lei e aos preceitos rituais.
Dessa forma, ao entrar em Jerusalém, Jesus evocou um novo tempo e revelou um Templo novo. Na grande cidade, Ele entrou montado num jumentinho, sinal da humildade e da simplicidade, para manifestar os verdadeiros sinais de sua messianidade. Deus humilha-Se para caminhar com o seu povo suportando suas infidelidades.
Os relatos da Paixão e da Morte de Jesus constituem o ápice dos Evangelhos. Todos os evangelistas narram a Paixão e a Morte de Jesus sob diferentes óticas e perspectivas. Alguns, bem mais detalhados. Outros, mais sucintos. Os detalhes de cada narrativa estão relacionados ao contexto vivido por cada comunidade e alicerçados naquilo que acreditavam ser necessário para transmitir a mensagem desejada. Lendo a perspectiva de Marcos, encontramos um Jesus simples, não combatente, entregue de modo livre e consciente. Esta narrativa é a mais antiga e dramática. Na hora derradeira, o Cristo foi humilhado, traído, abandonado, sofreu injustiças e experimentou a solidão.
Em Marcos, o fato principal é a solidão de Jesus. Em torno da Paixão, os outros evangelistas construíram uma série de manifestações e de personagens. Jesus foi traído pela multidão que desapareceu e preferiu Barrabás. O Cristo foi negado por Pedro; ridicularizado, espancado e humilhado pelos soldados; insultado pelos líderes do povo e pelos sacerdotes e pelos que passavam por Ele. Acompanhado por Sua mãe, pelo Discípulo Amado, por algumas discípulas e pelo Bom Ladrão. Diferente dos demais evangelistas, em Marcos, não encontramos ninguém. Tudo era escuridão, trevas e solidão.
A dureza e o escândalo da cruz foi um mistério assustador e um gesto excessivo que parecia ser sem sentido. No início do Evangelho, os discípulos abandonaram tudo e seguiram Jesus. Agora, na hora de Sua Paixão, todos abandonaram e fugiram Dele.
O Evangelho deste domingo apresenta de várias maneiras a condição humana de Jesus e sua humana paixão. Marcos quer mostrar um Jesus homem e não “super-homem”. De tal maneira, insiste na solidão e nas reações humanas do Cristo diante da morte. Os outros evangelistas não apresentaram um Jesus medroso e silencioso na Paixão. No entanto, no Horto das Oliveiras, o evangelista escreve que Jesus sentia grande medo e angústia (Mc 14,33). Além disso, sendo frágil e não conseguindo carregar a cruz sozinho, é ajudado por um certo Cireneu. Diante do Sinédrio, apenas confirma a pergunta: “Eu sou!” Diante de Pilatos, faz o mesmo: “és tu o rei dos Judeus? Tu o dizes!” Nada mais disse, justificou ou defendeu. Apenas silenciou e assumiu com liberdade o Projeto do Pai.
Jesus Cristo assumindo a condição humana, tornou-se igual aos homens e revelou toda a beleza de Deus. Ao assumir essa condição com Sua Morte na cruz, Ele eliminou, de forma definitiva, todo impedimento da relação entre Deus e os homens. Ele harmonizou e reconciliou com seu corpo oferecido e com seu sangue derramado o humano e o divino.
A cortina rasgada revelava o fim de uma religião que oferecia algo a Deus a fim de alcançar perdão e o início de um novo tempo em que é Deus quem se oferece aos homens. O véu do Templo se tornou sinal de que a cruz aboliu toda a distância entre Deus e os homens.
O lado transpassado de Jesus é a “porta” pela qual devemos entrar para a vida nova e para a partilha de um futuro diferente. O coração de Cristo vibra amor e paixão pela humanidade redimida e integrada. “Realmente este homem era o Filho de Deus!” (Mc 15,39). Portanto, nosso melhor antídoto é olhar a cruz de Cristo deixando-nos interpelar por seu último grito. Cristo morreu, gritando seu amor por cada um de nós. No momento da morte, Ele revelou que sua fragilidade é amar e que sua força é realizar o projeto do Pai. Na cruz de Cristo fomos salvos para que ninguém apague a “humanidade” do Evangelho. Na cruz de Cristo fomos salvos para que ninguém permaneça longe do olhar misericordioso e apaixonado do Pai.
Senhor, em meus medos e em minhas angústias, ensina-me a silenciar e a assumir, com liberdade, o projeto de Deus. Quando a solidão, as trevas e a escuridão se aproximarem de mim, dá-me a graça da Tua Presença a fim de iluminar minha caminhada. Reconcilia em minha história o humano e o divino que habitam em mim fazendo-me sentir Teu amor e Tua paixão capazes de me redimir e me reintegrar.
LFCM.
Bom Dia Frei muito lindo esse testo. Gratidão por me enviar. Reze por mim, por favor. Quero viver uma semana Santa Santa mesmo. Paz e Bem.