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A Liberdade de Deus

  • Foto do escritor: Frei Luis Felipe C. Marques, ofmconv.
    Frei Luis Felipe C. Marques, ofmconv.
  • 27 de mai. de 2023
  • 5 min de leitura

Atualizado: 3 de jun. de 2023

A plenitude da Páscoa é o Pentecostes e o dom pascal é, por excelência, o Espírito Santo. Ele ressuscitou o Cristo, fez ressurgir o coração amargurado e desiludido dos discípulos, deu vida à missão da comunidade primitiva. Na experiência do dom pascal gratuito, o Espírito transforma o dom em tarefa, em testemunho e em forma de vida.

Dessa forma, Pentecostes não é apenas o último dia do tempo pascal, mas a totalidade dos cinquenta dias. É a realização da Páscoa e não somente a festa do Espírito Santo de Deus. É a celebração da vida do Espírito do Ressuscitado na vida da Igreja. Nesse sentido, celebramos a vida do Espírito que anima a Igreja e atualiza o Mistério Pascal do Senhor morto e ressuscitado.

O relato do Evangelho deste domingo nos oferece outra perspectiva do encontro do Ressuscitado com seus discípulos. Ele mostrou-lhes as feridas da paixão e soprou sobre eles o Espírito do Amor que procede do Pai, fazendo-os criaturas pacificadas, portadoras do perdão e da reconciliação. O sopro de Jesus sobre seus discípulos nos remete ao momento da criação, quando Deus formou o homem do pó da terra e soprou-lhe nas narinas o fôlego da vida. O sopro de Jesus fez dos discípulos novas criaturas, tirando deles o vitimismo que os levava ao medo e ao esconderijo. Esse sopro deu-lhes força, alegria e um dinamismo jamais antes experimentado.

O encontro com o Senhor ressuscitado inverteu a existência dos Apóstolos e os transformou em testemunhas corajosas. Em todo lugar que o Espírito está, o mal é vencido, a tristeza é derrotada, o pecado é perdoado e nasce uma nova vida.

O Espírito, dom que vem do corpo do Ressuscitado, passa para os corpos dos discípulos a fim de que eles conheçam a alegria e o desprendimento. A comunicação de vida que se realiza através do Espírito não é intelectual e nem intimista, não é cerebral ou espiritual, mas ela é corporal: do corpo do Ressuscitado ao corpo do discípulo, do corpo dos discípulos formando o corpo da Igreja. Assim, acolher o Espírito é experiência do corpo, pois realiza-se no corpo envolvendo uma relação corporal. A ação do Espírito une o indivíduo à comunidade, junta o diferente ao igual e proporciona a comunhão a todos.


A comunhão é simbolizada na arte da comunicação. Mesmo falando diferentes línguas, o Espírito Santo é promotor da comunhão. É a invisível presença do Espírito que visibiliza a comunicação entre as comunidades.

O incompreensível, o rompimento e a falta de comunicação não vêm do Espírito. As comunidades cristãs que nascem do Espírito vivem o amor, sobretudo, na capacidade de escutar o outro, de perceber sua necessidade e de dirigir-lhe uma linguagem que lhe seja compreensível.


Olhar o Espírito é vivenciar a liberdade de Deus. Uma liberdade desconcertante, surpreendente e interpelante. Liberdade abundante que dá vida para “que todos tenham vida em abundância”. Ele é o sopro que vivifica, anima, restaura e congrega. O Espírito ajuda a nos libertarmos dos determinismos antigos, dos fundamentalismos perversos e das ultrapassadas metodologias fazendo com que experimentemos a verdadeira liberdade para amar e sermos amados.

O Espírito Santo nos abre à nova sabedoria, ao novo entendimento, à nova gestualidade e à nova vida. Ele “sopra” onde quer. O Espírito Santo é a Liberdade de Deus. Não sabemos de onde vem, nem para onde vai. É o Espírito que realiza os sonhos e os projetos do Pai. Ele inventa, sacode, faz novas as coisas, dá vida ao inesperado abrindo-lhe as portas do impossível.

Olhar o Espírito é reconhecer a criatividade de Deus que não nos permite anunciar uma letra pesada, sufocante ou que mata, mas nos impele a anunciar uma Palavra que vivifica, liberta e transforma. Essa criatividade tem o poder de nos fazer perceber uma verdade que não nos oprime ou nos limita, mas percebemos uma verdade inspiradora, livre e feliz. A criatividade do Espírito é a revelação de Deus no meio de nós e nos acontecimentos da história: em nossas vitórias e em nossos fracassos. Deus é sempre original e criativo nos métodos que usa para vim ao nosso encontro e manifestar sua presença entre nós: “Ele está conosco!”. A criatividade de Deus alcança a vida cotidiana com suas fadigas, fragilidades e quedas. É o Espírito que nos torna capazes de criar, decifrar, abrir novos caminhos permitindo-nos encontrar e reconhecer o Cristo vivo.


Olhar o Espírito é experimentar a fonte irradiante da ternura e do amor. A Liberdade e a criatividade de Deus é a máxima e incondicional misericórdia divino-humana manifestada pela ação do Espírito no corpo ressuscitado de Jesus. Não há limites para ação ou para a manifestação do Espírito. Ele não é condicionado a pessoas, grupos, ideologias, doutrinas ou igrejas. Ele é livremente criativo e não se deixa aprisionar por nada, por ninguém ou por qualquer coisa ou estrutura. O Espírito Santo é a visibilidade do relacionamento amoroso entre o Pai e o Filho.

Se nos abandonarmos ao Amor, deixarmos ser transformados por Ele e correspondermos ao Seu apelo, seremos tocados pelo Espírito e seremos habitados pela Trindade que concederá vitalidade para nossa existência e entusiasmo ao nosso testemunho.

O Pentecostes é um constante e atual convite a deixarmo-nos ser conduzidos pelo Espírito Santo. Ele traz consciência de quem somos, das mudanças que desejamos e da transformação que almejamos. Ele tem a melhor possibilidade, pois libera recursos sublimes em nosso interior abrindo-nos todas as portas que nos aprisionam. Pela amizade com o Espírito seremos livres e criativos, ternos e misericordiosos, comunicativos e surpreendentes fazendo nascer o mundo novo desejado pelo Cristo Pascal. A festa de Pentecostes renova a consciência de que a presença vivificante do Espírito de Deus que habita em nós, nos dá coragem para sair das paredes protetoras dos nossos “cenáculos”, pequenos grupos que nos acomodam numa vida tranquila e nos fecham em hábitos estéreis.


Celebrar o Pentecostes é vivenciar a “festa da colheita”. É hora de colher os frutos da Páscoa e torná-los saborosos para nossa vida e para a vida dos outros. O Espírito nos traz uma colheita generosa e abundante. A festa deste domingo nos oferta um surpreendente horizonte de compreensão, uma abertura do olhar, uma reviravolta, uma nova chave de interpretação de nós mesmos, da história, do mundo e da Igreja. Para Lucas, escritor dos Atos dos Apóstolos, Pentecostes é o cumprimento dos cumprimentos, a pulsão da nova aliança não fundada na Lei, mas no e pelo Espírito Santo. É o nascimento da Igreja, comunidade do Senhor imersa, habilitada e batizada no Espírito Santo, que proclama a boa notícia do Evangelho e é generosa no anunciar o perdão e a misericórdia.


Senhor, manda o teu Espírito, Ânimo Criador que me coloca diante do teu amor e da beleza do teu Reino. Que o teu Espírito me ajude a ser livre e feliz, amoroso e criativo. Libera do meu interior os recursos sublimes que me ajudem a encontrar as melhores possibilidades. Dai-me coragem para corresponder ao teu Amor, me abandonar Nele e ser transformado por Ele. Amém!


LFCM.



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