O itinerário quaresmal tem alguns objetivos: não nos dispersarmos, voltarmos ao essencial, decidirmos pela relação com o Criador e mantermos firmes os propósitos cristãos. Para alguns, a prática necessária é voltar e a retomar à vida cristã. Para outros, não dispersar a amizade com Deus. Outros ainda, preferem manter a decisão firme de permanecer junto Dele. O exercício quaresmal, dependendo da estrada percorrida e do caminho alcançado, serve para identificar a necessidade de cada ser individual e a necessidade da Igreja.
O pedido à conversão quaresmal tem como último fim a amizade com Deus, o entendimento da autoridade de sua Palavra, o resgate da relação filial, a reconstrução da história salvífica e a conquista de uma relação fraterna e harmoniosa.
O fazer penitência não é uma mortificação, mas uma vivificação do Espírito e do seu santo modo de operar. É nessa perspectiva que começa o Evangelho deste domingo: “o Espírito levou Jesus para o deserto”. A quaresma é um movimento do Espírito. É Ele quem revitaliza nossa existência. O deserto não é uma opção ou uma iniciativa pessoal, mas é o desejo do Espírito que faz Jesus acolher esse movimento interior empurrando-O a silenciar, encontrando-O com Deus, refazendo o plano de salvação e a descobrindo a harmonia com o Universo.
No início do seu caminho terreno, Jesus experimenta a comunhão e a solidão, a consolação e a tentação. Depois da imersão nas águas da purificação, vem a experiência da tentação narrada pelo evangelista Marcos. Enquanto os outros dois Evangelhos Sinópticos examinam as manifestações particulares da tentação, num percurso de grande eficácia e delicadeza, Marcos não está interessado em descrever de modo teatral as tentações, mas como alguém permanece, por um tempo de maturação, naquela situação complexa e interior.
Ao mesmo tempo, o espaço descrito por Marcos é deserto e paraíso. Neste espaço está o Espírito. É Ele quem levou Jesus ao deserto. Há a reconciliação entre o humano e o divino. Jesus habita essa presumível contradição. No deserto, Ele revive o jardim, sendo o novo Adão, vivendo entre os animais e servido pelos anjos. Dessa forma, Marcos apresenta-nos um Messias que habita no coração da realidade, habitado pelo Espírito e cercado pelo Divisor, pelas feras e pelos anjos do céu.
Jesus e os animais selvagens não eram inimigos e nem estavam distantes. Ele era o restaurador da harmonia perdida com o pecado. No deserto, Jesus não expulsou os animais selvagens, mas aprendeu a conviver em plena harmonia com eles. Ele é o novo Adão. Ele é o homem desperto em plena harmonia com a criação, com o cosmos e com as outras dimensões.
O serviço dos anjos não simboliza sua Divindade, mas sua harmonização com a terra e com o céu. Jesus é o homem inteiramente reconciliado e pacificado. Marcos não nos mostra um Jesus perturbado pela contradição do momento.
A completude do tempo acontece na reconciliação do Espírito e dos cosmos. É a unidade divino-humana presente em Jesus. É do coração que Ele dirige a cada um de nós, sua primeira exortação: “Convertei-vos e crede no Evangelho”. Para entender este processo de harmonização é preciso mudar a mentalidade. O Cristo manteve-se firme e decidido.
A forma com que Ele se relacionou com as tentações, construiu Sua identidade. A maneira como Jesus vivenciou o deserto, deu-Lhe um rosto visível para todos os que O encontrariam daquele momento em diante. Ele não fugiu da tentação, mas aceitou-a e gerou dela uma palavra nova e uma escolha de vida.
O messianismo de Jesus delineava-se pelo amor e pela partilha, na força da Palavra e na autenticidade, na revelação do rosto misericordioso do Pai e na oferta da sua vida para salvar a todos. Jesus não procurava relações de servidão, mas relações filiais. Ele procurava afetos sinceros e não respeitos religiosos-temporais. Vivenciando plenamente Sua humanidade, o Cristo revelou que sua missão era a Liberdade de aceitar, de desejar e de permitir que a vontade de Deus acontecesse de forma real e concreta em Sua história. O que podemos alcançar na Quaresma é: um modo de ver diferente, um encontro consigo mesmo e uma harmonia relacional. É tempo de colocar em ordem nossa vida e, como Jesus, aprender a viver a Liberdade e a Perfeita Harmonia.
Senhor, ajuda-me a harmonizar minhas contradições. Ensina-me habitar no coração da realidade e restaurar a harmonia Divina perdida com o pecado. Pacifica-me para aceitar meus limites e continuar na amizade contigo, no resgate da relação filial e na realização fraterna.
Olá Frei Bom Dia!!! Q texto maravilhoso!!!Mostrou q de verdade é a Quaresma. Tempo de exercitar uma aproximação filial com o Senhor no exemplo de Jesus Cristo. Algumas coisas eu vejo nesse exercício q devemos exercitar o ano todo. Gratidão por me enviar. Paz e Bem.