A perseverança na fé
- Frei Luis Felipe C. Marques, ofmconv.
- 11 de nov. de 2022
- 6 min de leitura
Atualizado: 17 de dez. de 2022
O Evangelho do penúltimo domingo do ano litúrgico (Lc 21, 5-19) é retirado do discurso escatológico lucano e apresenta uma exortação à perseverança, à vigilância e à paciência. Com esses discursos, Jesus convida seus ouvintes a não se deixarem levar pelo medo e pela angústia dos eventos catastróficos, pois eles estão longe de serem sinais de um fim imediato do mundo. Pelo contrário, devem ser acolhidos como uma ocasião de testemunho. O texto evangélico não trata do fim do mundo, mas do que acontecerá “antes” do fim.
O evangelista acena para sinais apocalíticos. Apocalipse não significa catástrofe, mas revelação. O uso de uma linguagem apocalíptica não quer mostrar algo desesperador, mas quer revelar o plano de Deus na conclusão da história. Jesus não fala do fim do mundo, mas do significado do mundo e da conclusão da história. Usando linguagem e imagens apocalípticas, Jesus quer remover o véu que nos impede de ver o mundo com os olhos de Deus. Quando Ele parece anunciar o fim do cosmos, não está se referindo ao fim do mundo, mas quer nos ajudar a entender o fim do mundo. Ele não explica “quando” será o fim (de que adiantaria saber?), mas desloca à atenção para “como” estamos nos preparando. O “quando” não deve ser o objeto da nossa atenção, reflexão e decisão, mas é o “como” que deve dar sentido ao tempo, a fim de encontrarmos plenitude, em meio ao caos histórico.
Na época de Jesus, uma das ideias recorrentes era de que o mundo estava muito corrupto e que seria substituído por uma nova realidade vinda de Deus. Antes de nascer o novo, os homens seriam tomados por grande medo. Povos e nações seriam perturbados. Haveria muita violência, doenças, infortúnios e guerras. O sol apareceria durante a noite e a lua durante o dia; as árvores começariam a derramar sangue e as pedras a rachar e a gritar. Essa linguagem e essas imagens eram bem conhecidas. No entanto, Jesus as usa para dizer aos discípulos que a passagem entre as duas épocas da história seria iminente. O anúncio de Jesus é de alegria e de esperança, pois quem sofre e espera o Reino de Deus deve saber que a alvorada de um novo e esplêndido dia está prestes a raiar. Esta é a razão pela qual Ele exorta os discípulos a não se assustarem e não se apavorarem (v.9). Adiante, recomenda: “Quando estas coisas começarem a acontecer, levantem-se e levantem a cabeça, porque o teu livramento está próximo” (Lc 21,28).
Mediante esses eventos, Jesus adverte cuidado e cautela aos seus discípulos: “Cuidado para não serdes enganados, porque muitos virão em meu nome, dizendo: 'Sou eu!' e ainda: 'O tempo está próximo.' Não sigais essa gente!”. Quando o medo ou a admiração tomam conta de nossos corações e das nossas razões, tendencialmente, nos enganamos por falsas promessas de uma terra prometida. A angústia e o desespero nos colocam diante de decisões enganosas, em que somos facilmente levados a seguir ideias e ideais não condizentes ao Evangelho pregado por Jesus. Com efeito, escolhemos tantos “messias” para defender nossas causas. No entanto, eles abusam da nossa ingenuidade, manipulam nossa inocência e instrumentalizam nossa crença para perpetuarem-se no poder. Não há nenhum salvador e nenhuma salvação, além daquela ofertada por Jesus na entrega de sua vida por nós, na cruz. Não há nenhum “Messias” além daquele que nos trouxe a verdadeira libertação, iluminou nossas cegueiras e nos deu a vida. É preciso distinguir a genuína mensagem do Evangelho a fim de salvá-la daqueles que dela se aproveitam para o bem próprio.
A dinamicidade revelada neste Evangelho mostra-nos o sentido profundo da nossa espera futura. Esperar por este mundo novo significa saber que todas as realidades do mundo presente, do jeito que são, devem desaparecer. Se nosso mundo e nosso universo fossem feitos para a duração eterna, Deus os haveria feito de modo mais estável e seguro. Se a criação, obra de Deus, deve passar, ainda mais, as obras dos homens. Todos os reinos humanos passaram, somente o Reino de Deus permanecerá. Os discípulos de Cristo não podem tornarem-se escravos dos medos e das angústias. Pelo contrário, eles são chamados a viver a história a fim de deterem a força destruidora do mal, na certeza de que a ternura providente e tranquilizadora do Senhor os acompanha sempre em suas ações do bem. Este é o sinal eloquente de que o Reino de Deus vem até nós, isto é, de que a realização do mundo como Deus quer está se aproximando de nós.
Ao longo da nossa história vivenciamos momentos dramáticos do ponto de vista pessoal e social, situações dolorosas que parecem não ter fim, eventos desastrosos, sistemas e condições que nos desesperam. Tais situações sempre marcaram a história do mundo e das pessoas. No entanto, necessitamos de uma fundamental atitude: conseguir ler os eventos tendo a capacidade de encontrar sentido à história, através de uma leitura responsável e saudável. Não é fácil entender o sentido de tudo o que tem acontecido nos últimos tempos. Somente com os olhos de Deus somos capazes de permanecer firmes e confiantes diante dessas adversidades.
A convicção de muitas pessoas é de que o mundo está chegando ao seu fim, sobretudo, quando veem que as motivações religiosas estão desaparecendo. A referência de Deus parece estar ofuscada, quase não vista. Mesmo que nos faltem motivações, não estamos caminhando para uma finitude sem sentido, mas para a plenitude da vida e do tempo, onde tudo será assumido em Cristo. Com efeito, às vezes, parece que estamos no limiar do fim do mundo. Quando ligamos a televisão, tudo se mostra precário: paz, previsões climáticas, economia, trabalho. As manchetes das notícias são boletins de guerras. É difícil ou quase impossível encontrar boas notícias. O mundo parece estar numa mistura de luz e escuridão. As notícias ruins parecem ser mais convincentes do que as boas. Um jornal que fale apenas notícias boas não tem a mesma audiência do que aquele que mostra tragédias. Os noticiários não dizem o que é o homem, mas no que ele se tornou. Devemos voltar imediatamente às páginas do Evangelho e aprendermos o desaprendido.
A vinda do Senhor é certa. Incerta é o dia e a hora. Haverá o acontecimento, mas não sabemos quando. Então, há a exigência de assumirmos uma contínua dinâmica de espera. Não devemos confundir espera com expectativa. A expectativa aceita apenas o estabelecido e tem autorreferencialidade: eu decido o bom e o ruim, ao mesmo tempo, decido como deve ser Deus. A espera não tem um objeto, mas é uma abertura ao inesperado; um acolhimento do inaudito que se alimenta da confiança e que acredita que toda chegada tem um sentido. Enquanto, a expectativa vive do imediatismo, a espera sabe respeitar o tempo certo. A expectativa se projeta no futuro, sendo ilusória e pouco real. A expectativa gera ansiedade e medo, a espera gera paz e certeza da chegada. Enfim, a espera é vida presente que reconhece a felicidade na história salvífica do aqui e do agora.
Jesus adverte contra a leitura de eventos históricos sem discernimento e lucidez, especialmente desastres naturais, guerras e tumultos, como se fossem um sinal da intervenção de Deus que pune ou decreta o fim. Aqui fica o convite: “não se deixem levar pelo medo, pelo terror”, não deixem que a alma e a imaginação percam o equilíbrio e comecem a ver sinais apocalípticos naquilo que é apenas um acontecimento da natureza ou fruto das falsas escolhas e dos pecados humanos, como a guerra. “Estas coisas devem acontecer primeiro, mas o fim não é imediato” (v.9). Estes acontecimentos trágicos são, infelizmente, o pão quotidiano da história e não os sinais precursores de um fim iminente do mundo. “É permanecendo firmes que ireis ganhar a vida!". Esta é a afirmação central do Evangelho deste domingo. A paciência deve ser uma das principais características do cristão. O contrário da paciência é o desânimo que está ligado ao desespero, produzindo preguiça, trazendo cansaço e impedindo de perseverar na fidelidade a Deus. Quem recebeu as boas novas de Cristo, quem acreditou Nele, quem veio e se tornou parte da Igreja deve viver a única coisa que lhe resta: a perseverança na fé.
Senhor, dá-me não temer as catástrofes deste mundo. Concede-me a compreensão do vosso plano nas conclusões da minha vida. Não permita que o medo tome conte do meu coração. Não permita que o desespero e a angústia me levem a seguir ideias ou ideais que não sejam de acordo com vosso Evangelho. Instrua-me a voltar às páginas do Evangelho para aprender o desaprendido. Ensina-me a ver o mundo com os vossos olhos, dando-me a graça de esperar pacientemente o tempo certo da vinda do Reino de Deus.
LFCM.
Gratidão Frei sempre por me enviar essas palavras de esperança para momentos difíceis. Paz e Bem.