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A pertença de Deus

  • Foto do escritor: Frei Luis Felipe C. Marques, ofmconv.
    Frei Luis Felipe C. Marques, ofmconv.
  • 21 de out. de 2023
  • 4 min de leitura

Antes de concluir o seu evangelho, Mateus relata três disputas entre Jesus e os fariseus. Após as parábolas, a discussão tornou-se séria e acalorada. Os adversários tornaram-se mais pretenciosos e questionadores sobre o estilo de vida de Jesus, pois perceberam que, por meio de parábolas, Jesus questionava o estilo de vida deles. A primeira disputa teve dimensão política e as outras duas apresentaram questões religiosas sobre a fé na ressurreição e sobre o maior mandamento.


O ensinamento de Jesus era simples e entendido pelos humildes de coração. Suas palavras estavam fundamentadas no seu estilo de vida, na sua coerência e na sua autenticidade. Ele usava uma linguagem simbólica e os líderes religiosos não conseguiam entender por causa de seus racionalismos doentios. Dessa maneira, os fariseus trouxeram questões e fatos a fim de colocar Jesus à prova. Eles fizeram perguntas, das quais sabiam as respostas. Atacavam o Mestre com métodos falaciosos na intenção de diminuir Sua influência com o povo.

Os líderes religiosos tinham o desejo de descredibilizar as palavras de Jesus, de criar conflito com os romanos e de confundir as pessoas simples que seguiam e acreditavam no Cristo.

Na tentativa de bajular Jesus, eles começaram pela tática perversa dos elogios humanos: “Mestre, sabemos que és verdadeiro e que, de fato, ensinas o caminho de Deus. Não te deixas influenciar pela opinião dos outros, pois não julgas um homem pelas aparências”.

No entanto, Jesus percebe a estratégia, a perversão e a hipocrisia da essência daquelas palavras. Rapidamente, o Mestre intui a maldade, a negatividade da oposição, o fanatismo e a maldosa estratégia. Com liberdade, criatividade, e inteligência, Ele desmascara aquele doentio discurso e comportamento.

Os habitantes da Judeia, da Samaria e da Idumeia eram obrigados a fazer uma moeda especial que deveria ter a imagem do imperador, César. Essa era a forma que eles espalhavam o culto ao imperador. Nesse sentido, o amor por César passava pelo dinheiro. Era um afeto quantificado. Era uma troca em que o vencedor estaria sempre presente e o outro seria obrigado a ficar escravo nessa relação. Diante disso, eles perguntaram: “Mestre, é lícito ou não pagar imposto a César?”. Se a resposta fosse negativa, os fariseus acusariam Jesus como contestador do imperador, um inimigo de Roma. Se, a resposta fosse positiva, Ele seria odiado pelas pessoas simples, por aqueles desprovidos de dinheiro para pagarem impostos ao império romano.


Em vez de responder diretamente, Jesus desnorteou seus interlocutores. Diante da pergunta sobre o pagamento de impostos, Ele respondeu com profundidade aquilo que seus adversários não esperavam. A resposta de Jesus não pode ser unicamente interpretada no sentido da separação dos poderes: de um lado, o poder civil; do outro, o poder religioso. A resposta de Jesus está direcionando o homem, em sua totalidade à pertença a Deus. A moeda é de César, mas o homem é de Deus.

Na dinâmica bíblica, há uma incompatibilidade radical entre “Deus” e “César”, entre a paixão pelos poderes mundanos e a paixão pelos serviços do Reino, entre o “Deus” que é amor e “César” que é abuso de poder. Não é possível amar a Deus, falar de Sua generosidade, de Sua compaixão e de Sua misericórdia e, ao mesmo tempo, praticar a injustiça, a exclusão e a vingança. O apego aos “césares” apresenta-se como uma tentação fascinante, pois como todo ídolo, o amor a “César” provoca adoração, enganador encanto e falsa disposição.

Na expressão “dai a César o que é de César e a Deus o que é de Deus”, muito conhecida popularmente no nosso tempo, alguns autores e biblistas traduzem por “retirai de César o que é de Deus” ou “não dai a César o que é de Deus”. Dar a Deus o que é de Deus, é dar a Ele, a dignidade humana. É dar a Ele, o homem integrado consigo mesmo, purificado de seus interesses escusos, curado de suas feridas do corpo e do espírito. É dar a Ele um homem que é capaz de ser relacionar saudavelmente. Dar a Deus o que é de Deus é retirar das mãos dos “césares” do nosso tempo o homem aprisionado, materializado produto tributário de um poder liberal e moralista.


Devolver a Deus o que é de Deus é dar a possibilidade ao homem de exprimir seus desejos de maneira saudável e libertadora vendo o outro como própria imagem de Deus e entendendo-se como parte dessa mesma imagem do Criador. Restituir a Deus o que é de Deus é devolver ao homem sua semelhança com a divindade. Não somente somos à imagem de Deus, mas somos Sua semelhança.

Reconfigurar a semelhança de Deus em nós é um trabalho diário que é capaz de conquistar os mesmos sentimentos do Filho de Deus Humanizado. O caminho da humanização divina passa pela restituição da imagem e da semelhança do Criador.

Quem olha a moeda, vê César. Quem olha a minha vida, deve ver a Deus. Este é o ensinamento de Jesus ao afirmar: quem me vê, vê o Pai. O caminho do Espírito é marcado pela reconstrução da imagem e pela conformação da semelhança de Deus. Vivenciar a espiritualidade é permitir com que Deus restaure a beleza de Sua imagem em nós recompondo a bondade com que nos criou. Se assim vivermos, não daremos espaço para a hipocrisia, para a maldade e para a perversidade. Portanto, restituir a semelhança divina existente em nós é retornar à perfeição com que o mesmo Deus nos pensou e expressou em nós seus próprios sentimentos.


Senhor, ensina-me ter Teu estilo de vida, Tua coerência e Tua autenticidade. Instrua-me agir diante das adversidades da vida com inteligência, criatividade e com liberdade. Desejo tornar-me amor ao invés de poder para falar aos meus irmãos da Tua generosidade, da Tua compaixão e da Tua misericórdia. Dai-me a graça de ser sempre Tua pertença entendendo que sou parte de Tua imagem e semelhança.


LFCM.







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