A proposta desafiadora
- Frei Luis Felipe C. Marques, ofmconv.
- 22 de fev.
- 3 min de leitura
Atualizado: 8 de mar.
Após o discurso sobre as Bem-Aventuranças, coração do Evangelho, Jesus continuou com sua pregação revelando seu novo modo de pensar. Ele tinha o desejo de ensinar seus seguidores, não apenas uma moral e uma ética, mas uma maneira diferente de pensar e de agir. Um seguidor de Jesus era distinguido pelo princípio fundamental da proposta evangélica, pois Ele desejava que seus seguidores pudessem dar passos a caminho do amor, do bem e da justiça: “Se amais somente aqueles que vos amam, que recompensa tereis? E se fazeis o bem somente aos que vos fazem o bem, que recompensa tereis? E se emprestais somente àqueles de quem esperais receber, que recompensa tereis?”.
No centro da mensagem, Jesus confrontava aqueles que O seguiam com palavras difíceis de serem aceitas. Ele propunha horizontes nunca vistos e convidava a percorrer caminhos dantes não traçados: “amai os vossos inimigos”, “fazei o bem aos que vos odeiam”, “bendizei os que vos amaldiçoam”, “rezai por aqueles que vos caluniam”.
A proposta era desafiadora. Entretanto, parecia exagerada e fora dos padrões. Quando Jesus fala sobre o amor ao inimigo, não está pensando em um sentimento de afeto e carinho por ele, mas sim em uma atitude humana de interesse positivo pelo seu bem. Porém, como amar quem não nos ama e não quer ser amado? Como fazer o bem a quem nos odeia?
Amar o inimigo é mais do que amar o próximo. O inimigo é especificado como aquele que odeia, amaldiçoa, maltrata, calunia e expressa sua inimizade com violência física, roubos, reivindicações, calúnias e falsas narrativas. Obviamente, a inimizade encontra infinitas formas de se expressar. A indicação que emerge das palavras de Jesus manifesta uma ação positiva. O modo de mostrar-se mais forte do que a violência sofrida é o gesto de passar da reação à ação.
Ao amar o inimigo, ofereço-lhe a possibilidade de ser uma nova pessoa, fazendo com que a forte violência que empurra seu coração para o mal seja transformada em amor. Desse modo, amando sem ser amado, fazendo o bem sem recompensas e doando sem interesses próprios, podemos viver a proposta desafiadora de Jesus.
O desejo de sermos amados, abençoados e perdoados é a motivação que temos para amar, abençoar e perdoar. Fizemos da reciprocidade um valor central da nossa cultura, da nossa educação e de nossas boas maneiras, mas a reciprocidade não é um conceito evangélico. Jesus nos convida ir além dela e sairmos da mentalidade de troca. O Mestre substitui a reciprocidade pelo altruísmo, ou seja, ajudar o próximo sem esperar nada em troca. Permanecer na reciprocidade significa permanecer na lógica humana, excluindo o caminho do Evangelho.
Ao assumirmos escolhas melhores diante das angústias, sofrimentos e traumas construímos uma vida mais coerente com a proposta de Jesus e nos tornamos melhores.
O interesse de Lucas ao apresentar a desafiadora proposta de Jesus para amar os inimigos tem como intenção revelar a misericórdia do Pai plenificada em seu Filho. A fragilidade de Deus é a sua misericórdia. Assim, todo discípulo do Mestre dever ser misericordioso. O Evangelho de Lucas é uma reproposição dessa expressão.
Presos à lógica do pecado, da justiça, do castigo e do arrependimento acreditamos que a experiência com a misericórdia é meritória, esquecendo-nos que o amor de Deus é incondicional por cada um de nós. A misericórdia supera a justiça porque oferece ao outro, como neste Evangelho, ao inimigo, aquilo que ele não merece, o excedente.
O amor ao inimigo constitui o núcleo da proposta desafiadora de Jesus. É no perdão ao inimigo que o discípulo deve ser reconhecido. Não há nada maior e mais fecundo do que o amor. O amor confere à pessoa sua dignidade, enquanto o ódio e a vingança a desvaloriza, deturpando a beleza da criatura feita à imagem de Deus. É dessa consciência que surge a força para romper com a lógica da reciprocidade e o desejo de ser protagonista de um nova mentalidade. Ao sairmos dessa lógica e alcançarmos o que desejamos, recebemos os primeiros benefícios do Reino, pois Deus é amor.
É precisamente esse amor a proposta evangélica ensinada por Jesus e a contribuição mais humana que alcança a todos e que, sem exceção, busca o bem de todos.
Senhor, ajude-me a crescer no amor e no abandono à lógica da reciprocidade. Ensina-me a compreender que o amor e o perdão a mim oferecidos são a motivação para amar e perdoar aqueles que não me amam e não me perdoam. Educa-me a viver Tua proposta desafiadora de amor, de justiça e de paz.
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