A testemunha, o amigo e a voz
- Frei Luis Felipe C. Marques, ofmconv.
- 16 de dez. de 2023
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Os três primeiros versículos da narrativa evangélica deste domingo, extraídos do prólogo do evangelista João, apresentam o Batista como testemunha: “Ele veio como testemunha, para dar testemunho da luz”. João Batista é quem dá testemunho sobre o outro. Desde o início, o evangelista especifica o profeta com surpreendente prontidão: “Ele não era a luz, mas devia dar testemunho da luz”.
O Batista é, antes de tudo, aquele que “não é”, mas que sabe dar espaço à presença de Jesus, pois aprendeu a discerni-la e alegrar-se com ela, afastando-se da sua própria “autorreferencialidade”.
De Jerusalém, os judeus enviaram sacerdotes e levitas para questionarem a identidade de João Batista. João, por três vezes, respondeu: “Eu não sou o Messias”. Sua coragem e liberdade revelam a grandeza do Deus que habita em seu ser. A resposta do Batista é admirável, pois revela que ele não tem o desejo, nem a intenção de ocupar “espaços alheios”. João não usurpa o que não lhe pertence. Ele tem consciência de ser “a voz que clama no deserto”. Ele sabe que sua voz é profética e é emprestada às necessidades do Senhor: “Endireitai o caminho do Senhor”. Em João Batista, não há falta de responsabilidade e nem falsa humildade, mas há a coragem de deixar espaço para a ação do Cristo.
O Batista é um homem que não tem medo de se deixar questionar pela realidade, revelando-se realmente quem é. Ele reconhece seus limites (“não sou”), admite que não é o protagonista (“Eu sou a voz de quem grita...”), confessa que depende do outro (“Não sou digno de desatar o cadarço das suas sandálias”).
Hoje, diante da cultura do protagonismo em que somos reconhecidos se estivermos no topo ou se formos o centro das atenções, o profeta João nos aponta o verdadeiro caminho do discipulado de Cristo. Ele não é a luz, mas a testemunha da luz. Ele não é o noivo, mas o amigo do noivo. Ele não é a Palavra, mas é a voz da Palavra.
A estrutura religiosa do Templo sentia-se questionada por esse homem do deserto, sem ornamentos luxuosos, vestindo pele de camelo e tendo uma vida de austeridade. O profeta do Jordão é um contestador por meio da sua escolha de vida. Ele não usa vestes sacerdotais, embora tivesse o direito de usá-las por fazer parte da casta sacerdotal. Ele não mora nos lugares apropriados de um sacerdote, mas à beira do rio. Ele faz perguntas ao invés de dar respostas. Ele se veste do que a própria natureza o proporciona para não ser tornar o centro das atenções. Ele não se apodera da Palavra, mas coloca-se ao serviço Dela. Através dessas escolhas, Deus faz da vida de João a teologia da revelação de Sua presença. Ele ilumina porque permite que a Luz de Deus atravesse a sua vida e toda a sua história.
A Testemunha da Luz revela que experimenta e que vivencia a “Fonte”. Ele sabe como iluminar a escuridão que habita no interior de cada ser humano. A Testemunha da Luz ilumina com sua presença e com sua força interior os que buscam a Deus com sinceridade de coração. Ele não diz palavras forçadas, não dá respostas prontas e nem estabelece distâncias entre o divino e o humano.
Ele não é a Luz, mas ilumina a todos, sendo Testemunha da Luz. As pessoas boas, sinceras e transparentes “aplainam o caminho” para Deus. Elas irradiam luz quando vivem e amam, quando falam e olham, quando rezam e acreditam. O ser humano é luz quando expande o seu verdadeiro “eu” transcendendo a humanidade que o habita e se conectando com a Fonte que lhe integra.
No caminho discipular do Evangelho e do seguimento a Jesus é preciso ter coragem para afirmar sempre: Eu não sou o Cristo e não quero sê-Lo! Muitos se cansaram de viver o Evangelho, no mundo de hoje, pois tinham como meta a necessidade de “imitar” a Cristo e não de viver seu estilo de vida. Apenas quando sabemos quem realmente somos, não ocupando lugares que não são os nossos e não usurpando a imagem do outro é que podemos nos tornar bons e autênticos discípulos do Mestre. É preciso ter força e liberdade para assumir aquilo que somos.
Eu não sou o Cristo, apenas decidi viver o estilo de vida ensinado e praticado por Ele. A clareza de quem “não sou” e de quem jamais serei, ajuda-me a entender a missão de João Batista e, consequentemente, a minha e a do próprio Cristo.
João nos ensina louvar a fragilidade, rejeitar a onipotência e renunciar a autorreferência. Ele é a figura fundamental para o Advento do Senhor. Suas palavras nos convidam trilhar um caminho que nos leva a Jesus. O Batista nos convoca a preparar o caminho para participar de algo novo e desconhecido. Inspirando-nos na figura do profeta do Jordão, que revela quem ele é, devemos reservar um tempo para nos contemplar por dentro, pois somente transcende quem se aproxima da própria interioridade, do próprio coração, da própria essência. Portanto, ser fiel à própria identidade é ser fiel a Deus e a nossa vocação de sermos filhos da Luz.
Senhor, ensina-me a afastar-me da minha própria “autorreferencialidade” para dar o devido espaço à presença e à ação de Cristo. Dá-me ter a coragem e a liberdade para não ocupar “espaços alheios”. Ajuda-me a ser testemunha da Tua luz. Ensina-me que a luz que devo irradiar tem como fonte verdadeira o Teu coração. Permita-me expandir a Tua luz na aceitação das humanidades que me habitam. Educa-me ao teu estilo de vida para que, na conquista da minha identidade, eu possa ser fiel.
LFCM.
Bom Dia Frei, Paz e Bem!!!
Gratidão por me enviar palavra q esclarecem o caminho q devo seguir. Por favor Frei reze por mim. 🙏🏽🙏🏿🙏🏾