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Desejar as Palavras do Espírito

  • Foto do escritor: Frei Luis Felipe C. Marques, ofmconv.
    Frei Luis Felipe C. Marques, ofmconv.
  • 20 de ago. de 2021
  • 3 min de leitura

Atualizado: 27 de ago. de 2021

O discurso de Jesus sobre o pão da vida na sinagoga de Cafarnaum está chegando ao fim. Os judeus que o procuravam como milagreiro, permanecem desconcertados com a ideia apresentada. É chegada a hora da decisão: continuar vivendo como sempre, adaptando-se à sabedoria do mundo e satisfazendo-se com apenas o pão material ou dar um salto de qualidade acolhendo o Evangelho. Neste sentido, hoje, o centro do Evangelho é a fé, materializada com o verbo “crer” e evocada com os verbos “ouvir”, “ver”, “vir”, “ter”.


Os discípulos encontram-se escandalizados com a proposta do discurso de Jesus. Para eles, a proposta é dura: “Quem consegue escutá-la?”. O discurso não é incompreensível, é apenas inaceitável.

Com isso, o trecho revela a crise da comunidade que vivia ao redor de Jesus. Os passos necessitam ser dados, no entanto, unir a própria vida à de Jesus e ser dom na vida do outro, envolve grandes riscos.

A palavra de Jesus é dura, como um remédio amargo necessário e que nos cura. Suas palavras dão vida, pois vêm do Espírito de Deus e não respondem apenas às necessidades físicas/ biológicas. Portanto, existem duas formas de viver. Na primeira, podemos ouvir palavras que nos fazem viver, questionar, crescer. Palavras que nos firam, mas também nos curam; na segunda forma, vivemos buscando palavras de satisfação. Palavras que alimentam a nossa imagem e satisfazem e confirmam nosso ego nos iludindo. Essas palavras “satisfatórias” não saciam nossas “fomes”, apenas nos deixam um grande vazio. As palavras do Espírito, mesmo com dureza, nos fazem sentir vivos e consolados profundamente.


Os discípulos são convidados a abandonar a lógica dos raciocínios corporais para aderir à lógica do Espírito. Não apenas o discurso é duro, mas os ouvidos e os corações estavam endurecidos. Ademais, os discípulos são convidados a não procurarem a presença de Cristo nos sinais materiais, pois a compreensão nasce não da visão da carne, mas com os olhos da fé. A conclusão é desconcertante, mas previsível: “muitos discípulos voltaram atrás e não andavam mais com ele”.

Muitos discípulos preferiram voltar atrás, preferiram voltar a se contentar com palavras do corpo. Palavras superficiais, falsas, egocêntricas, enganosas, mas saborosas o suficiente para proporcioná-los uma satisfação imediata e aparentemente duradoura. Voltar atrás no relacionamento com Jesus significa estar satisfeito com o superficial das relações ambíguas e com a ambiguidade da vida supérflua. Contudo, voltar atrás é uma possibilidade ou uma escolha de cada um de nós.

Temos neste Evangelho, não apenas o relato do que aconteceu com os seguidores de Jesus, mas a revelação do que acontece hoje na arriscada aventura da vida cristã. Voltar atrás e não querer mais continuar com Jesus é uma “escolha normal”. Os discípulos que voltaram atrás não são simplesmente traidores ou somente desejaram abandonar seus projetos. Ao contrário, quando escolhem não continuar no seguimento há lucidez e coerência de que a missão de Jesus e a vivência quotidiana são exigentes. A radicalidade de uma vida autêntica e inteiramente doada é dramática.


Dessa maneira, no ato de deixar o seguimento há tanta coerência com as exigências do Evangelho e com o Reino a ser construído. Não porque não se compreende, mas porque a lógica de Jesus, por vezes, é inaceitável. Por isso, a vida cristã é uma escolha contínua entre o desejo de seguir as Palavras do Espírito e a tentação de se alimentar com as palavras da carne que alimentam os nossos afetos feridos.


Pergunta Jesus: “Vós também vos quereis ir embora?” Sua pergunta é clara e direta. No entanto, a narrativa do Evangelho não termina com a pergunta. Ao questionamento de Jesus, temos a resposta interrogativa e a profissão de fé de Simão Pedro: “A quem iremos, Senhor? Tu tens palavras de vida eterna. As palavras de Pedro são claras, decisivas e precisas. Portanto, Jesus e o Evangelho são propostas e devem continuar como proposta. Quando deixamos de assumir esta dinamicidade, perdemos o compromisso com a coerência humana e com a liberdade evangélica.


Senhor, onde posso encontrar tanta humanidade, serenidade, verdade, beleza, iluminação? Onde posso encontrar algo ou alguém que me permita ser verdadeiramente o que sou? Onde, Senhor? Mostra-me! Somente na tua presença é que posso encontrar compaixão e futuro. Somente nela encontro paz de espírito e liberdade. Ajuda-me a não escolher as decisões distantes das tuas Palavras. Somente Tu, Senhor, tens Palavras de vida eterna.


LFCM.

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