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O homem da espera

  • Foto do escritor: Frei Luis Felipe C. Marques, ofmconv.
    Frei Luis Felipe C. Marques, ofmconv.
  • 10 de dez. de 2022
  • 6 min de leitura

O Evangelho deste domingo traz a contextualização de João Batista na prisão. Neste momento de perseguição de sua principal mensagem, ele faz uma pergunta que resume toda sua pregação e toda a revelação do Antigo Testamento: “És tu, aquele que há de vir, ou devemos esperar um outro?” Essa pergunta quer saber a identidade de Jesus. Ele está perplexo e até confuso. É evidente o contraste entre o que ele havia anunciado e o que estava sendo realizado por Jesus. Assim, a resposta é decisiva porque seu anúncio havia chegado ao limite quando ele tinha sido levado à prisão.


Antes, João Batista estava no deserto. Agora, está na prisão. Antes, gritava com convicção que viria alguém mais forte do que ele. Agora, pergunta em voz baixa se é Jesus aquele que há de vir. Seja no deserto ou na prisão, na forte pregação ou na simples pergunta, João continua à espera Daquele que vem. Ele é o homem da espera que vive sob a força da graça. É precisamente sua espera que permite com que ele esteja em dois lugares, símbolos de morte: no deserto e na prisão. Sua espera torna-se esperança para as multidões que o procuravam no deserto e para os discípulos que o visitavam na prisão. A expectativa cristã da vinda do Senhor é um dom de esperança para os homens.


Entretanto, a pergunta de João manifesta sua dificuldade e sua crise em acreditar na presença do Senhor na história. Tal pergunta revela a distância existente entre suas expectativas e a manifestação real do Senhor. A dúvida de João nasce da situação de que ele estava esperando um Messias glorioso e juiz. No entanto, as manifestações de Cristo não mostravam esse Deus vingador, rigoroso e poderoso. Ele tinha anunciado um Messias justiceiro que viria punir com severidade os pecadores, mas, ao contrário, desde o início de sua pregação, Jesus fez um outro caminho. João entra em crise diante de um Deus inesperado, com um rosto humanizado. A fadiga e a dificuldade de João em acreditar num Deus humano e misericordioso é semelhante à dos homens de todos os tempos.


Os discípulos do profeta do deserto aproximam-se de Jesus e fazem a pergunta. A resposta de Jesus é surpreendente. Ele não entra em polêmicas. Não demostra, mas mostra. Não responde de modo direto, mas testemunha com sua obra, em conformidade com a missão do profeta anônimo anunciado por Isaías. Une ouvido e visão: "Ide contar a João o que estais ouvindo e vendo”. Essa união não é apenas funcional, mas experiencial. Não basta ouvir nova mensagem, é preciso ver novas coisas. Saber sobre o Messias que vem não é satisfatório. É necessário experimentar Sua presença nos processos humanos de libertação, nos cegos que passam a ver, nos surdos que conseguem ouvir, nos pobres que são evangelizados, nos leprosos que são curados, nos mortos que ressuscitam. Os fatos cumpridos por Jesus mostram que Ele é o realizador das promessas messiânicas anunciadas por Isaías e por João Batista. Todas essas realidades servem como sinais de salvação e não de condenação.

É surpreendente o anúncio da misericórdia: “Feliz aquele que não se escandaliza por causa de mim!". De fato, a misericórdia é ocasião e motivo de escândalo para aqueles que esperam a justiça de um Deus sem humanidade. Esse escândalo é gerado pelo novo rosto de Deus manifestado em Jesus quando destrona as regras do poder religioso que convencia todos a partir do medo. O Batista é elogiado por Jesus. Por certo, ele não tinha os recursos suficientes para imaginar um Deus humano e misericordioso. A conversão indicada por João, ao mesmo tempo, servia para ele mesmo. O grande risco do homem é criar um Deus a partir da sua imaginação infantil, adorando-o à medida das suas expectativas e fazendo dele um ídolo consumista e sentimental.

O fato de João estar na prisão e trazer uma pergunta a partir das suas crises de fé não pode ser apenas narrativo-histórica. Sendo o último profeta do Antigo Testamento, sua prisão, traz uma chave de leitura profunda. A forma como o Batista pensava a revelação divina e se relacionava com um Deus interessado em vigiar e punir é a prova concreta dessa profundeza. Dessa maneira, quem pensa Deus a partir de uma imagem de vigilância e punição vive uma prisão e uma crise de fé. Quando não se reconhece que a revelação divina está no rosto misericordioso e humano de Jesus não se pode experimentar verdadeiramente Deus. Para sair dessa prisão racional é importante não ouvir apenas os profetas, mas ver as ações que Jesus realiza, também, por meio deles. Todos os sinais realizados por Jesus falam de vida. As mais perigosas prisões são aquelas das nossas ideias e convicções “pouco” teológicas.


Um Messias que não surpreende e não suscita maravilhas não pode ter sido enviado por Deus. Todos os caminhos e modos como Deus se manifestou na história e continua se manifestando são maravilhosos e surpreendentes. Aliás, quando as coisas de Deus não nos causam mais admiração é sinal de que nossas lógicas estão ocupando por demais o espaço da fé em nossos corações. O distanciamento dos símbolos que unem e que mostram a presença de Deus fazem do homem um ser racional, doente de insensibilidade e excluindo a própria divindade de sua convicção.


Bem-aventurado aquele que não se escandaliza com a misericórdia conseguindo abandonar as prisões racionais que impedem experimentar a nova visão de Deus. A fé é sempre uma história de reformulação de nossas convicções. O Advento é o tempo mais propício para reformular nossa ideia de Deus. Um Deus feito homem resgata nossa vida dos desertos e das prisões, das situações de morte e das equivocadas convicções. O Advento é tempo de graça. Não é suficiente acreditar em Deus. É necessário purificar nossa fé todos os dias. Neste trabalho interior de vigilância e conversão é decisivo curar nossa imaginação das produções psíquicas irreais a fim de perceber não um personagem de conto de fadas, mas receber o Deus que nos interpela, nos envolve e nos ama incondicionalmente. Isso deve ser nosso motivo de alegria e de animação.


Ser homem do Advento é viver a liberdade de esperar algo que está a nossa frente, com firmeza, fé e força. Caminhar ao encontro d’Aquele que vem e saber captar a iminência de Sua chegada é a estrada para transformar nossa existência numa feliz espera, sobretudo, quando conseguimos perceber a presença humilde e quotidiana, discreta e eficaz do Senhor. A alegria do cristão consiste em não ser prisioneiro dos atuais fatos e em não se deixar oprimir pelo peso da história, mas em acreditar e confiar que o Senhor tem para todos um futuro de bondade.


Senhor, ajuda-me a celebrar as festividades natalícias sem visão infantilizada, mas com uma fé madura, convicta e aberta ao teu livre chamado. Liberta-me dos sentimentalismos vazios e superficiais. Dá-me uma visão não superficial e um ouvir verdadeiro para estar realmente em tua presença. Ensina-me a não me escandalizar com a imagem de um Deus que não veio para condenar, julgar ou se vingar, mas Daquele que veio e vem nos salvar e nos misericordiar. Tira-me das prisões racionais e dos desertos interiores para que eu possa alegrar-me e exaltar-me com Tua vinda.


LFCM.



Proclamação do Evangelho de Jesus Cristo segundo Mateus 11,2-11

Naquele tempo,

2 João estava na prisão. Quando ouviu falar das obras de Cristo, enviou-lhe alguns discípulos,

3 para lhe perguntarem: "És tu, aquele que há de vir, ou devemos esperar um outro?"

4 Jesus respondeu-lhes: "Ide contar a João o que estais ouvindo e vendo:

5 os cegos recuperam a vista, os paralíticos andam, os leprosos são curados, os surdos ouvem, os mortos ressuscitam e os pobres são evangelizados.

6 Feliz aquele que não se escandaliza por causa de mim!"

7 Os discípulos de João partiram, e Jesus começou a falar às multidões, sobre João: "O que fostes ver no deserto? Um caniço agitado pelo vento?

8 O que fostes ver? Um homem vestido com roupas finas? Mas os que vestem roupas finas estão nos palácios dos reis.

9 Então, o que fostes ver? Um profeta? Sim, eu vos afirmo, e alguém que é mais do que profeta.

10 É dele que está escrito: 'Eis que envio o meu mensageiro à tua frente; ele vai preparar o teu caminho diante de ti'.

11 Em verdade vos digo, de todos os homens que já nasceram, nenhum é maior do que João Batista. No entanto, o menor no Reino dos Céus é maior do que ele". Palavra da Salvação.


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1件のコメント


Marcia Severo
Marcia Severo
2022年12月12日

Gratidão por me enviar palavras q me comovem e me ajudam no exercício da conversão. Frei, por favor, me coloque em suas orações. Obrigada. Paz e Bem🙏🏽🙏🏿🙏🏾

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