O poder da Presença e da Palavra
- Frei Luis Felipe C. Marques, ofmconv.
- 27 de jan. de 2024
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No início do Evangelho de Marcos, a Presença e a Palavra de Jesus continuam a ter um poder extraordinário. Após ter apresentado o chamado dos quatro primeiros discípulos, o evangelista revela a chegada do Reino de Deus e a plenitude dos tempos, a partir da potência terapêutica de Jesus. Deste modo, Marcos narra que um dia, ao entrar na sinagoga, Jesus começou a ensinar. Esse ensinamento provocou admiração naqueles que se encontravam no culto. Não sabemos o conteúdo do ensinamento, mas observamos que o modo como Jesus ensinava diferenciava-O dos mestres da Lei.
Ele “ensinava como quem tem autoridade”. O seu saber não era o dos livros e nem do seguimento de outro mestre. O seu saber possuía força e poder originais. O seu ensinamento não estava fechado nas doutrinas e nas práticas judaicas, ligadas aos sumo sacerdotes e às exigências do tempo.
Na sinagoga, Jesus não discutiu sobre Deus de forma abstrata. Ele não propôs teorias sobre a pureza dos ritos e dos alimentos. O Cristo não ofereceu uma doutrina sapiencial moralista. Ele não apresentou normas de conduta. Para o evangelista, tudo isso é secundário, pois ele quer nos revelar que Jesus possui a autoridade humana capaz de destravar sentimentos estranhos e de estremecer forças potentes. A Presença, a Palavra e os gestos do Mestre sintetizam um novo tempo cheio de plenitude.
Na sinagoga havia um homem possuído por um espírito mau. “Espírito mau” significa tudo o que bloqueia a relação com Deus e a comunhão com os outros. Esse espírito reconheceu a Presença potente de Jesus e começou a gritar. Sendo pertencente da comunidade, primeiramente, aquele espírito professa sua fé: “Eu sei quem tu és: tu és o Santo de Deus". Um homem fiel à oração, à participação na assembleia e ao cumprimento dos preceitos. O fato é paradoxal: como um homem tão fiel poderia possuir um demônio? A narrativa revela um fiel habituado à rotina da fé, conhecedor de vários aspectos da comunidade e da doutrina, mas que não passava de fato externo e racional. O espírito mau habitava o seu interior e, por isso, suas manifestações eram más e cheias de divisão.
A fé daquele homem tornou-se diabólica. Todos os seus sentimentos e palavras tinham o objetivo de dividir, de desunir. De arruinar e não de edificar. De destruir e não de construir. Ele era um refém do espírito impuro. Parecia que ele vivia agradável naquela situação: "Que queres de nós, Jesus Nazareno? Vieste para nos destruir?”. Ele não queria sair da comodidade de seus costumes e nem ser tocado em suas tradições e, muito menos, nas “margens da sua fé”. Ele sabia que o Messias viria. E mais, o espírito mau reconheceria a Presença de Jesus. Ele acreditava que reconhecer a Presença do Mestre lhe seria suficiente, mas o Cristo, devolveu-lhe a dignidade da vida e da fé.
Acreditamos ter fé. Entretanto, muitas vezes, nossa fé está habituada em costumes, em dados estéticos, incapaz de abrir-se ao novo tempo. O demônio que habitava aquele homem, reconheceu Jesus, mas perguntou se Ele desejava acabar com tudo para refazer tudo novamente. O murmúrio revestido de fé faz Jesus proferir poucas, mas poderosas palavras: "Cala-te e sai dele!"
A força da Palavra do Messias é imediata: “o espírito impuro, dando um grande grito, violentamente saiu daquele homem”. À imagem e à semelhança de Deus, o poder da Palavra recria aquele homem inaugurando nele o tempo da plenitude. A Palavra ungida deu uma nova vida e libertou o interior humano, habitado pelo espírito divisor. O evangelista, ao colocar essa libertação na sinagoga como o primeiro sinal de Jesus, tem o objetivo de afirmar que a primeira libertação que o Senhor realiza em nossa vida é a libertação da visão demoníaca da fé.
A potente Palavra de Cristo silenciou o tentador e a mediocridade da fé. Sua Presença fez ir embora uma fé inútil e sem incidência na realidade. Atualmente, encontramos tantos e muitos bons praticantes, homens e mulheres religiosamente ativos, mas endemoninhados. É preciso estarmos atentos porque podemos frequentar todos os “domingos” a “sinagoga”, sermos fiéis ao culto e aos ritos e escutarmos a Palavra. Todavia, podemos manter dentro de nós, espíritos maus, diabólicos, de desunião e de divisão. A Palavra de Deus não é apenas para ser admirada com atenção. A Palavra de Deus deve ser vida e para a vida.
A Palavra do Senhor é plena de autoridade, mas cheia de leveza, de amor e de libertação. A Presença de Jesus desamarra, liberta, purifica todo ser humano que se encontra oprimido. As autoridades religiosas reconhecem apenas a Lei. O povo simples reconhece a ação de Jesus: “Ele ensina com autoridade, não como os doutores da lei”! Entretanto, o espírito mau reconhece que Jesus é o Santo de Deus. O Cristo cala o espírito e liberta a pessoa. Ele resgata a dignidade do homem reintegrando-o na sociedade e trazendo a vida em sua integralidade. Portanto, todas as vezes que nossas palavras não forem capazes de unir, abençoar, plenificar e amar, ela não pode ser de Deus.
Senhor, ajuda-me com o poder da tua Presença e a da tua Palavra a ser verdadeiramente livre. Dai-me a graça de uma vida mais plena e integrada. Quero ser livre de uma fé acomodada nos costumes, presa aos detalhes estéticos e racional. Desejo que a minha fé seja capaz de unir, abençoar, plenificar e amar.
Bom Dia Frei. Q texto maravilhoso!!! Preciso crescer muito na Fé, querendo mais e mais ser desapegada as coisas desse mundo. Penso q à liberdade está no desapego das coisas desse mundo. Paz e Bem.