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O que estais procurando?

  • Foto do escritor: Frei Luis Felipe C. Marques, ofmconv.
    Frei Luis Felipe C. Marques, ofmconv.
  • 16 de jan. de 2021
  • 4 min de leitura

Atualizado: 11 de abr. de 2021

O percurso do discipulado de Jesus começa com uma pergunta: o que estais procurando? São as primeiras palavras de Jesus no evangelista João. Temos um trecho cheio de encontro, coragem e de liberdade. Recordemos que três anos depois, logo após a ressurreição, surgirá a mesma pergunta: “mulher, o que procuras?”.


É sempre o mesmo verbo, aquele que define muito daquilo que somos, homens e mulheres que procuram. Jesus, mestre e exegeta do coração, se interessa sempre pelo interesse daqueles que o procuram. Quer entender a razão pela escolha. Deseja que sejam conscientes da escolha e não habituados a respostas cômodas, seguras, corretas e belas.

Dessa forma, Jesus recolhe o desejo deles, não considera-os banais, infantis e sem sentido. A pergunta – o que procuras? –, pode ser traduzida por: o que desejas? Posso ajudar!

Se alguém procura algo é porque sente falta, mesmo que não saiba responder com precisão o que se está procurando. Em geral, a pergunta que Jesus faz, evoca a sua vocação, ou seja, ouvir o que o outro tem a dizer. Os corajosos discípulos revelam o interesse deles: onde moras?


Portanto, a pergunta dos discípulos coloca em evidência a simplicidade inicial do desejo. Os discípulos querem saber onde é a morada de Jesus; qual o lugar dos seus afetos, dos seus encontros e das suas relações vitais; querem saber quem ele é. Eles sabem que o lugar que habitamos fala muito de nós. Entrar na casa de alguém é a oportunidade de experimentar uma intimidade e partilhar um espaço vital e pessoal. Com isso, os dois discípulos pedem para conhecer a Jesus de forma mais pessoal. Então, Jesus não lhes diz uma técnica, um método, uma definição, uma doutrina, mas os convida a ver.


Nesse contexto, atentos ao texto evangélico, vemos que esses dois primeiros discípulos eram também seguidores de João. Esse, como sabemos, morava no deserto e percorria toda a região do Jordão. De qualquer modo, o desejo desses dois discípulos revela que o caminho proposto por João não era o mais interessante e pleno. Então, com o convite e a proposta de Jesus, certamente os discípulos se maravilharam.


Num primeiro momento, talvez em nenhum outro, não vemos pedidos mirabolantes de sacrifícios estranhos, nem mesmo jejuns que parecem eternos ou comidas que não são humanas, nem também imolações e ofertas dos seus sonhos mais valiosos, mas uma oferta diferente que os chamava a habitar um espaço de mistério.

Os discípulos, que seguiam o Batista, a sua vivência e proposta de penitência, se maravilham com a nova proposta e colocam-se no desejo de construir um novo tempo e de caminhar com Jesus.

Nesse sentido, o seguimento de Jesus nunca pode ser algo que alguém me contou, mas sempre um mistério visto e experimentado. A fé não é um fazer e um saber, mas um conhecer e um caminhar.

Além do mais, o mestre quer mostrar àqueles que manifestaram o desejo de segui-lo, que o anúncio cristão, mais do que palavras, é feito por testemunhos, experiências, novos encontros, aproximações, olhares e toques.

Depois, temos um interessante detalhe escrito por João: “era por volta das quatro horas da tarde”. Aquele dia, aquela hora e aquele instante são importantes de serem relatados, pois revelam e marcam o início de uma nova história, de um tempo novo e de uma nova criação. Tal detalhe é muito humano, pois todos nós trazemos na nossa memória, dias e horas fundamentais. Dias e horas que marcaram o início ou a necessidade de uma nova construção.


Em vista disso, o evangelho de hoje começa com João fixando o olhar em Jesus e afirmando a sua vinda como cordeiro de Deus; e, termina com o olhar de Jesus em Pedro dando-lhe uma nova identidade. Esse agora assume o nome de Cefas. A mudança do nome indica uma novidade profunda que Cristo traz para a vida de Pedro.

Em ambos os casos, o olhar é intenso e profundo. A nossa vocação é um modo de olhar. É preciso ver diferente, ver aquilo que nem todo mundo consegue ver, ver todas as coisas com os olhos de Deus.

Enfim, o texto conclui sem mostrar onde era a verdadeira morada de Jesus. Por isso, aqui precisamos entrar num nível mais profundamente simbólico-teológico. A resposta para a pergunta dos discípulos significa muito mais. Numa tradução poderíamos dizer que os discípulos perguntam: onde é o teu onde?


Dessa forma, os discípulos descobrem que Jesus permanece no Pai, na sua palavra, no seu projeto e no seu amor. Com efeito, vemos que a proposta apresentada por Jesus para os discípulos é poder permanecer na profunda comunhão com o Pai e com o Espírito. O Pai é o espaço vital, pessoal e relacional de Jesus. Era preciso ver esse espaço de mistério.

Assim, o “onde” de Jesus é sempre o Pai e no seguimento esse “onde” também torna-se o “onde” do discípulo. De fato, não tinha como os discípulos não se maravilharem com tal proposta. Diante disso, continuar a seguir o Batista parecia ser estranho e pouco.

Com isso, vemos que a pedagogia litúrgica dessas três últimas semanas ajuda-nos a crescer em humanidade e na relação com Deus. Na solenidade da Epifania, vimos o caminho dos magos que olharam para o alto e descobriram que o Senhor tinha se revelado. Depois, na festa do batismo de Jesus, descobrimos um projeto amoroso e salvífico pensado por Deus desde sempre e revelado pela voz do Espírito. Hoje, a liturgia nos convida a apresentar ao Senhor qual o desejo mais profundo que habita o nosso coração, mesmo que seja um desejo simples e aparentemente banal.


Diante de todo e qualquer interesse, mesmo sendo simples e banal, o caminho proposto será sempre grandioso e pleno. Sim, porque ir ver a casa de Jesus é deixar toda segurança construída por nossas teorias para abrir-se ao projeto de amor e de salvação que o Pai tem para cada um de nós.

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