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Que queres de nós, Jesus Nazareno?

  • Foto do escritor: Frei Luis Felipe C. Marques, ofmconv.
    Frei Luis Felipe C. Marques, ofmconv.
  • 30 de jan. de 2021
  • 4 min de leitura

Atualizado: 11 de abr. de 2021

Depois de ter apresentado a potência da palavra de Jesus no chamado dos quatro primeiros discípulos, o evangelista Marcos apresenta a potência terapêutica da sua presença e dos seus gestos.

Com isso, no texto de hoje temos a narração da libertação de um homem possuído. Nessa cena podemos colher o primeiro aspecto da vida nova que Jesus nos traz, a libertação da nossa visão de fé. Tudo isso quer ilustrar os primeiros versículos do proprio evangelista: o reino de Deus está próximo e o tempo se completou.

O primeiro fato que nos chama à atenção é a presença na sinagoga desse homem possuído. E mais, em Cafarnaum, centro das atividades de Jesus; no dia de sábado, dia principal das orações; e, entre os mestres da Lei. Como todos os fatos do evangelho, esses também não são apenas detalhes da circunstância, mas sim uma construção simbólica que tem muito a nos dizer.


Jesus entra na sinagoga no dia de sábado e dedica-se a ensinar. É a primeira vez que o evangelista Marcos fala da atividade didática de Jesus. O centro do ensinamento é o mistério da sua pessoa. Será um tema bastante recorrente nesse primeiro evangelho, mesmo que com poucos discursos.


Por conseguinte, ele estando pleno de autoridade, suscita admiração. A intuição dos presentes indica que tem alguma coisa de novo. Ele é diferente dos escribas. O seu saber não é de livros, nem do seguimento de algum outro mestre, ele possui uma fonte original. Na verdade, ele possui uma autoridade humana, capaz de destravar os sentimentos mais estranhos e de fazer estremecer as forças mais potentes.

No coração do texto do Evangelho está o encontro de Jesus com um homem possuído. Ele confessa e reconhece perfeitamente a chegada do Messias. Todavia, este homem é a imagem do crente cotidiano, que vive por hábito uma experiência religiosa que não lhe diz mais nada. Paradoxalmente, o espírito impuro que habita nele impede-o de ser tocado e de aproximar-se. Mas, Jesus vai curá-lo com sua presença e sua voz.

Então, podemos observar uma fé que se tornou diabólica (divisão). Aqui, a divisão consiste em professar a fé, mas não declarar o desejo de envolver-se verdadeiramente com Jesus. De fato, o espírito impuro não quer ser perturbado, porque sabe quem é Jesus. A fonte dessa revelação são as próprias perguntas do homem possuído: o que queres de nós, Jesus Nazareno? Vieste para nos destruir?


Hoje, ao nosso modo de ver, podemos perguntar o mesmo para Jesus: vieste para destruir a minha fé mesquinha? Vieste para me colocar em crise? Vieste para me fazer ver diferente? Vieste para me tirar da comodidade dos costumes e mexer com as minhas tradições? Vieste para mudar o meu modo de ser? E Jesus, como outrora fizera, nos diz: cala-te e sai desse murmúrio de fé. Sim, eu vim para te devolver a vida; para te ajudar no caminho de crescimento, mas iluminando as suas crises e as suas perguntas inteligentes; para te ensinar a não alimentar os seus demônios; para te dar liberdade, lucidez e consciência livre.

Porém, por vezes, parece que preferimos uma fé esquizofrênica, inútil, que não tem incidência na vida real. Nesses termos, posso ser um bom praticante e religiosamente ativo, mas ser um endemoninhado.

Dito de outro modo, podemos continuar indo todos os sábados na sinagoga, todos os domingos na Igreja, frequentando nossos cultos ou nossas missas, cumprindo bem os nossos ritos, escutando a Palavra, rezando ou orando, contudo mantendo dentro de si um espírito doente e possuído, uma alma longe do espírito cristão e do Evangelho, um coração infinitamente dividido.


Dessa maneira, preferimos viver uma fé meramente devocional, uma pertença exterior; uma fé intelectual, com requintes racionais; ou ainda, uma fé com costumes socioculturais e políticos. Ademais, uma fé que permanece fechada no recinto sacro, feita de sagrados formalismos, de respeito ao passado e de nostalgias doentias; não querendo mudar de mentalidade e, consequentemente, o destino do mundo.

Assim, escolhemos viver toda uma vida como cristãos de domingo, sem se deixar tocar de fato pela potente e transformante palavra de Deus. Uma potente palavra que é capaz de expulsar os demônios que domesticamos.

Por essa razão, o evangelista nos deu um sinal de alerta. A primeira libertação que o Senhor realiza na nossa vida é a de uma visão demoníaca da fé. O perigo não é tanto fora, mas dentro de nós, ou seja, do interior das nossas escolhas. Por isso, a palavra de Deus não é simplesmente para ser admirada com atenção, mas é uma palavra de vida e para a vida.

Fica evidente, com isso, que o evangelista Marcos neste domingo está nos alertando sobre o modo como estamos nos deixando tocar por Jesus. Estamos fazendo o nosso caminho com resistências demoníacas ou com uma admiração autêntica e coerente?

Na realidade, pode ser que também nós já tenhamos procurado e encontrado alguma estratégia para não sermos perturbados em nossa fé cotidiana. É melhor ficar repetindo sempre o mesmo. Ora, o evangelho de hoje nos convida a sermos sinceros conosco mesmos e a revisitar a nossa opção religiosa e cristã.


LFCM.

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1 Comment


Valéria Rezende de Oliveira
Valéria Rezende de Oliveira
Jan 31, 2021

Quanto ensinamento na sua homilia de hoje. Devemos nos perguntar sempre como está nossa vivência fé. Obrigada

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