Senhor, salva-me!
- Frei Luis Felipe C. Marques, ofmconv.
- 12 de ago. de 2023
- 4 min de leitura
Atualizado: 26 de ago. de 2023
Os discípulos estavam admirados com os milagres de Jesus e com o povo ao redor deles, pois experimentavam o poder de Deus, o sucesso de Jesus e a aprovação das pessoas. Para que não caíssem na vaidade e na idolatria daquela multidão, Jesus fez com que eles subissem no barco e seguissem para o outro lado do mar. O objetivo de atravessar para a outra margem era afastá-los da tentação do poder mundano, dos louvores humanos e das satisfações pessoais. Sem que percebessem se as situações eram favoráveis, se o horário era propício e animados pelo entusiasmo, subiram no barco e iniciaram a travessia. Eles partiram por conta própria, enquanto Jesus despedia a multidão.
Após despedir o povo, Jesus subiu ao monte, sozinho, para rezar. Ele entrou em comunhão com o Pai, pois os discípulos ainda não conseguiam perceber que tudo dependia da bondade de Deus. Então, Jesus subiu ao monte para orar a sós e entregar tudo a Deus. Sabendo que tudo vinha do Pai, Ele devolvia tudo ao Pai. Enquanto rezava e os discípulos atravessavam o mar sozinhos, a noite tornava-se traiçoeira, as ondas se agitavam, a tempestade ficava forte e o vento contrário. Àqueles experientes pescadores não sabiam mais como reagir diante da violência do mar e da potência dos ventos. Eles começaram a sentir medo. Tomados pelo desespero, perceberam a ausência de Jesus.
Com o barco agitado pelas ondas e pelo vento contrário, os discípulos perderam o controle da situação e enganados por uma falsa visão acreditaram ver um fantasma. A situação era tão difícil que eles não conseguiam perceber a significante e real presença de Cristo. Todos eles experimentavam a debilidade, a dúvida, o medo e a pouca fé.
A escuridão da noite tempestuosa serve como imagem da desorientação e da dúvida que domina até o fiel mais convicto. Nos momentos de escuridão, até quem é animado pela fé sólida sente-se sozinho e faz a dolorosa experiência do silêncio de Deus. Por vezes, para o nosso amadurecimento na fé, na confiança e no amor, o próprio Senhor Jesus nos permite seguir sozinhos a travessia.
Na simbologia bíblica, as águas turbulentas representam as forças do mal, o caos, a destruição e a morte. A travessia dos discípulos não é fácil. Toda passagem é exigente e comprometedora. O mar agitado revela que os discípulos estão com as emoções descontroladas. Ao contrário, Jesus caminha sobre as águas e mostra que Ele tem o controle das situações e das emoções. A perturbação interior e a gritaria exterior são acalmadas pela voz de Jesus e pela confirmação da Sua presença: "Coragem! Sou eu. Não tenhais medo!" O caminhar de Jesus sobre as águas revela seu poder sobre as forças da morte.
Ao perceberem que não estavam diante de um fantasma, mas do Senhor, em nome da comunidade, Pedro lançou um desafio. O “sou eu” de Jesus trouxe confiança e segurança para todos e o caminhar de Jesus sobre às águas trouxe perplexidade, espanto, surpresa e estupor. Como Jesus, Pedro desejou caminhar sobre as águas, desejou controlar as emoções, desejou vencer as forças da morte. Quando ele colocou os pés para fora do barco, viu que podia manter-se forte e permaneceu com os olhos fixos em Jesus. Firme e convicto, deixando de lado o medo, seguiu andando. No entanto, voltando a pensar na profundidade do mar e no vento forte, ele começou a afundar.
Ao cair, ele vive a experiência fundamental de todo discípulo. Sem Jesus e sozinho não se vai a qualquer lugar. A ausência da comunidade o torna incapaz de vencer o medo e ele grita pela salvação. Pedro passa do entusiasmo e da coragem de descer do barco ao medo de afundar na fraqueza da fé. Então, Jesus lhe estende as mãos. Esse gesto revela uma iniciativa: Ele não impõe Pedro segurar suas mãos, mas o propõe.
Toda essa narrativa nos convida a refletir sobre nossa fé. Nas travessias da nossa vida passamos por desalentos e solidão. Todos compartilhamos, para além do tempo e do espaço, dentro dos quais nos encontramos, a bela e frágil natureza humana. O maior perigo é nos deixar determinar pelo medo, pela insegurança emocional e pelo desespero da falta de fé. O verdadeiro problema não está na tempestade, mas no medo. Ele é sinal de pouca fé no Senhor do céu, da terra, do mar e de toda a história da existência. Crescemos na fé quando e nas quedas da vida. Devemos segurar nas mãos do Senhor para sairmos do medo e alcançarmos a esperança.
Muitas vezes desejamos seguir adiante controlando as situações e as emoções, mas o medo nos bloqueia parecendo nos afundar. Há sempre a falta de confiança em nós e na presença de Jesus. Somos controlados pelo desejo e pelo medo. Contudo, Jesus aceita a fraqueza da nossa fé e nos estende as mãos quando caímos. Nos momentos difíceis da vida e na escuridão do caminho, sobretudo, quando nos sentimos com dúvida e com medo, não devemos ter vergonha de gritar: “Senhor, salva-me!”.
O Evangelho de hoje nos convida a nos abandonar em Deus. A fé nos oferece a segurança de uma Presença que nos impulsiona a superar os temporais existenciais e nos oferece a certeza de uma mão que sempre nos segura firme. Nos momentos turbulentos do nosso caminho, quando perturbados perdemos a razão e nos descontrolamos, somos convidados a confiar no Senhor. Ele sabe da fragilidade da nossa fé e da força do nosso medo. A invocação de Pedro: “Senhor, manda-me ir ao teu encontro!” e o seu grito: “Salva-me, Senhor!” assemelham-se ao medo e à angústia que nos acompanham em nossos momentos tempestuosos, mas, sobretudo, devem ser a expressão do nosso desejo de sentir a presença do Senhor em nossas vidas.
Senhor, salva-me! Ajuda-me nas travessias do meu mar. Afasta-me das vaidades e dos louvores humanos. Dai-me a maturidade na fé para os momentos frágeis da minha existência. Não permita que eu seja confundido por visões extraordinárias, mas ensina-me sempre acreditar na tua presença real e significante. Quero caminhar contigo aprendendo a controlar meus sentimentos. Segura minhas mãos oferecendo tua presença consoladora quando o meu medo e as minhas quedas forem inevitáveis. Alcança-me quando eu cair e quando eu quiser desistir afundado em minhas emoções.
Gratidão Frei. 🙏🏽🌻